sexta-feira, 1 de julho de 2011

"Soul kitchen" de Fatih Akin 2009


Ouvi falar desse filme na apresentação da disciplina do mestrado, 'Pós-modernidade e Educação', onde o Profº Leandro disse que ele reunia características desse momento atual em que vivemos. E esta semana tive oportunidade de assistir.

Dito isso, é inevitável não pensar em 'bagunça' depois de assistir! Uma grande bagunça e confusão numa deliciosa comédia alemã, recheada de sarcasmo e situações absurdamente possíveis!!

Seria esta a síntese da pós-modernidade? 

Talvez com vocabulário mais floreado, poderíamos trocar 'bagunça e confusão' por 'multiplicidade e complexidade', quando conhecemos o jovem Zinos, dono de um restaurante fuleiro chamado 'Soul Kitchen' e apaixonado por Nadine, sua namorada exigente e mimada. 

Nadine resolve morar em Xangai e quer que Zinos vá com ela. Não houve diálogo, nem consenso, ela simplesmente quis ir e exige que ele concilie o relacionamento e o ganha-pão, como se fosse a coisa mais simples do mundo, sem entender que é isso que causa tantas 'distrações', o que frequentemente irrita Nadine. É aos gritos que os dois se entendem, na tentativa falha de simplificar o complexo. Nem mocinha ou vilão, apenas dois protagonistas imperfeitos como qualquer um de nós!

E é nessa partida de Nadine, que Zinos vivencia múltiplas experiências que darão novo rumo a sua vida. 

Se antes acomodado com um restaurante decadente, servindo os pratos de sempre, com um público de sempre, Zinos resolve experimentar o novo, empregando um cheff de cozinha inflexível, que considera a culinária uma arte. Também aos berros, os dois se entendem, e o restaurante ganha um público novo, mais jovem, menos fiel e totalmente instável. Um risco que valeu a pena correr, afinal só assim Zinos poderia aumentar sua renda, quitar suas dívidas, ampliar o restaurante e pensar em se mudar para Xangai. Aparentemente, tudo resolvido!

Mas só com isso, um restaurante que vai da ruína ao sucesso e um protagonista que atinge seus objetivos,  teríamos uma narrativa clássica bem previsível, e a receita do filme é justamente a imprevisibilidade. Tudo pode acontecer, de preferência ao mesmo tempo!  Sem lógica ou sentido, apenas casualidades, conseqüências de escolhas impulsivas, típicas das imperfeições humanas. E se essa cadeia de acontecimentos fizer sentido e se cruzar, situações improváveis se tornam possíveis.

Na parte inicial da história, ao erguer peso, Zinos desenvolve uma hérnia de disco e durante todo filme, luta contra as dores, conhece a fisioterapeuta Ana, recusa fazer cirurgia e anda completamente torto. 

Mas ainda que esteja numa situação problemática, sua determinação de morar com Nadine é grande, e a falta de opções, faz Zinos passar a gerência do restaurante para o irmão, presidiário cumprindo pena em regime semi-aberto, um malandro total, viciado em jogo e movido pela impulsão. Só não é um perfeito vilão, porque lhe falta a esperteza!

Cego pela necessidade sexual e sentimental, Zinos não percebe os verdadeiros vilões ao seu redor. Um colega de infância, traiçoeiro, que quer comprar o restaurante a qualquer custo. Seu irmão no comando vem a calhar. 'O que poderia dar errado?'

É nesse fluxo de acontecimentos que a história ganha força. O que acontecerá com nosso protagonista? Curará sua dor? Ficará com Nadine? Enriquecerá com o restaurante? Receberá os aluguéis atrasados do velho marinheiro? Punirá seu irmão por se desfazer do restaurante?

Não importa! O ritmo é tão acelerado, que só nos dá tempo de acompanhar a trama, enquanto acontece, quase sem piscar. Cada segundo, uma nova informação para processar.

Quando Zinos consegue viajar para Xangai, reencontra Nadine com outro. Sua cegueira o desperta para uma dura realidade. Não tem mais namorada, nem restaurante, nem apartamento. Só lhe resta o irmão e a dor nas costas como consolo. E aqui poderia ser um final infeliz.

Mas este é um filme de muitos finais. De muitos acontecimentos, de várias relações entre os acasos e totalmente imprevisível. Uma total confusão, mas nem por isso confuso. 

Mais uma vez, Zinos dá uma guinada na história e consegue recuperar o restaurante, agora com o espírito transformado e iniciando um novo relacionamento com Ana, a fisioterapeuta. E mais uma vez, o novo se abre para Zinos e para todos os personagens da história. 

Talvez pós-modernidade seja um pouquinho disso. Fluxo de acontecimento e informações. Imprevisibilidade. Acaso. Múltiplos Finais. Cadeia de relações. Prováveis possíveis. Ritmo. Velocidade. Confusão. Bagunça, mas ainda assim vida. Complexa, mas vida!

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