terça-feira, 3 de maio de 2011

"A antropóloga" de Zeca Nunes Pires 2010


Para apreciar este filme é necessário desarmar-se. Suspender todo e qualquer conhecimento técnico, postura extremamente crítica e entregar-se por inteiro ao que o filme pode oferecer. Foi o que fiz! Eu me entreguei!

Ao invés de ser exigente, preferi encarar a coragem de Zeca Pires com admiração. Um alguém que continua tentando filme após filme, aprender, experimentar e representar o que temos de melhor aqui na ilha...nossa Floripa! Nosso estado...tão misturado! Tão esquecido e engolido pelas representações do eixo Rio-São Paulo, seu samba, carnaval, violência, conflitos...

Talvez por isso, finalmente conseguimos fazer um cinema diferente em Santa Catarina, que foi reconhecido ao ser selecionado pela primeira vez na Mostra Internacional de São Paulo. Fato inédito e Zeca Pires merece o crédito. Nunca parou de tentar!

Se me perguntarem se é bom...não sei o que responder, só posso dizer que gostei!
Timidamente gostei! É uma opinião frágil...quando o encanto ainda permanece e...prevalece!
Não posso negar os limites técnicos de elementos centrais como determinadas atuações, falas por vezes artificiais demais, que nos desencantam e destroem linhas frágeis da catarse (e às vezes nos forçam), mas fiel ao "suspender-se", me esforcei em sempre retornar e deixar passar qualquer falha que pudesse se apresentar....

Levei sustos, ri bastante, encantei-me com a cultura do lugar onde nasci, e de talvez ser apresentada de forma mais íntima a um universo tão próximo de mim, mas ao mesmo tempo tão distante...do imaginário popular sobre bruxas e lendas, retratadas tão criativamente pelo artista Franklin Cascaes, esforçado em preservar as memórias, que naturalmente se perdem diante de um atropelamento urbano e cultural...

O canto da Lagoa parece intocado, preservado e fiquei contente do filme fazer este resgate...
Ora mescla ficção, ora documentário, e mal acostumados, ficamos confusos, mas também admirados pela familiaridade com a câmera, que certos personagens de si mesmos conseguem apresentar....depoimentos reais de quem acredita, de quem ainda produz e perpetua um imaginário popular ainda forte na região.

Enxerguei meus sogros, manezinhos, que tanto me ensinaram sobre certas lendas e certas expressões e rezas... enxerguei a origem de tantos estereótipos, esgotados pelos trabalhos escolares em apresentações de bois de mamão, bruxismos e afins...

A trama é simples, ainda tímida, superficial, mas que faz amarras interessantes com a cultura local...

Uma protagonista portuguesa, solitária, que vem ao Brasil, Floripa, Canto da Lagoa, fazer uma pesquisa sobre uso de ervas para fins medicinais. Faz entrevistas, amizades e envolve-se inteiramente com as crenças populares, ora duvidando, ora deixando-se levar...

Eu, que sou tão supersticiosa, não veria o filme de noite, sozinha...mal conseguiria caminhar na rua....por mais fantasiosa que sejam partes da história, há algo de misterioso no mundo que não podemos negar...talvez algumas crenças sejam possíveis...talvez....

Um filme que vale a pena ver, ainda tímido e ingênuo, diante de tantos aparatos técnicos e efeitos mirabolantes dos filmes hollywoodianos, e diante de tanta violência urbana e sexualidade dos filmes nacionais mais populares...um filme delicado, ainda criança...talvez fazendo nascer um novo cinema e uma nova perspectiva para um mercado ainda prematuro...

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