segunda-feira, 30 de agosto de 2010

"Filadélfia" de Jonathan Demme 1993


Em 1993 fui com meus pais no cinema e só lembro de acordar no final da sessão. Eu tinha uns 8 anos. Acho que nem era pra minha idade.
Devo ter assistido outras vezes depois, mas assim como em outros filmes, nossa memória nos engana e esquecemos totalmente da história e ao assistir novamente algum filme do passado, somos apresentados a um mundo novo da ficção com muita fantasia, comédia, drama e/ou romance.
"Nossa, não me lembrava desse detalhe!" "Nossa, não me lembrava desse ator!" "Nossa, não lembrava da história mesmoo!"
Enfim, com um acervo de mais de 500 filmes, este foi o filme escolhido para assistir numa noite de sábado, debaixo das cobertas, muito bem acompanhada pelo meu noivo, claro! Foi escolha dele, já que envolvia advogado, sua profissão! =)
"Filadélfia" é a história de um advogado, Andrew Hackett, homossexual (super discreto), com aids (vírus HIV manifestado) que demitido por justa causa do escritório de advocacia, alegando preconceito, resolve entrar na justiça para lutar por seus direitos.
O personagem é protagonizado por Tom Hanks, seu advogado (inicialmente preconceituoso) é Denzel Washington e seu namorado (super fofo e atencioso) é Antônio Bandeiras. Todos bem novinhos e numa ótima performance dramática. Tão boa que o filme foi premiado com o Oscar de Melhor Ator (Tom Hanks) e Melhor Canção (composta por Bruce Springsteen).
Por muito tempo, a câmera nervosa, sob o olhar de quem se sente ameaçado e/ou apavorado por uma pessoa contaminada, age como olhos nervosos dos personagens, atenta a cada movimendo de Andrew: o que ele toca e onde ele toca. Pavor real, reflexo de uma sociedade que na época não sabia lidar muito bem com uma doença tão devastadora e mortal. (se é que hoje já sabe!) Mas pior que o preconceito diante da doença, é o preconceito com a opção sexual de Andrew, tida como causadora e disseminadora da doença e colocada como escolha. Os chefões do escritório, alegam que Andrew escolheu contrair a doença, a partir de suas preferências sexuais, diferente de quem contraiu inocentemente numa transfusão de sangue. Santa ignorância! (perdoem-me mesmo os ignorantes, mas ninguém escolhe contrair uma doença. Até pode estar suscetível, quando se tem uma vida sexual ativa, como o número crescente de soropositivas donas-de-casa que contraem de seus maridos infiéis. Obviamente elas não usam camisinha por serem casadas e por confiarem nos seus homens, que levam pra casa o tal vírus mortal! Escolha uma ova! Deles talvez, mas não delas! Coitadas!)
Não muito longe da ficção, Dourado do Big Brother 2010, causou polêmica, ao afirmar durante o confinamento que somente homossexuais contraiam HIV e heteros não.
Estamos em 2010 e a falta de informação e esclarecimento ainda é grande, mesmo que a sociedade pareça menos apavorada, já que o vírus parece controlado (ainda que mortal).
É difícil morrer de AIDS como antes, como morreram nossos mestres da música Cazuza e Renato Russo. Com as novas descobertas, os soropositivos levam uma vida plena, controlados por medicações fortes, e sem apresentar uma aparência tão debilitada como antes. Os cuidados continuam sendo necessários e os riscos ainda são reais, tanto para os soropositivos, quanto para os sexualmente ativos, independentemente de suas opções sexuais.
Assistir ao filme me fez pensar que o preconceito não reside somente na doença, mas no pavor de assumir o papel de quem sofre preconceito. Viver diante de tanta ignorância e falta de esclarecimento, como Andrew viveu na ficção. Com aparência debilitada, o personagem contou com muito apoio da família e de um namorado que não é soropositivo. Escolha do diretor em mostrar que a pessoa soropositiva leva uma vida normal e é amado pelos entes queridos, mesmo diante de tanto sofrimento. Não é somente um promíscuo ou um drogado, os que contraem a doença, mas às vezes por falta de esclarecimento, um jovem, descobrindo a vida sexual, numa única ocasião, num único deslize, contrai uma doença irreversível. Um erro comum, dificilmente isolado.
Mesmo numa biblioteca, ao tossir ou encostar em algo ou alguém, as pessoas tremem de pavor. Andrew lê um trecho da lei em que diz que a AIDS é uma doença social, pois mais que as conseqüências da doenças, o indivíduo sofre isolamento e preconceito, dificultando ainda mais a luta pela vida, pois menospreza, torna-o inválido e o exclui, antes mesmo que a doença cumpra esse papel.
Um filme da década de 90, mas atual. Não porque a sociedade ainda apresenta uma postura apavorada, mas porque o risco ainda existe, o cuidado ainda é necessário e a falta de esclarecimento é mais comum do que se imagina! Mesmo diante de tanta mobilização, propaganda, campanhas. O esclarecimento às vezes tem que partir de dentro!

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