quarta-feira, 25 de agosto de 2010

"A origem" de Christopher Nolan 2010

Queria eu ter domínio sobre algum conceito de subconsciente, mas mesmo sem isso e com um pouco de Jung no repertório pessoal, misturado a uma imaginação cinematográfica, consegui entender com clareza a proposta de Nolan.
Fui ao cinema com a mente e postura aberta diante do que poderia vir de Nolan, sabendo que corria o risco de sair com dor de cabeça e com a sensação de frustração, caso não entendesse sua proposta, ou pelo menos, um mínimo dela.
Diferente de outros depoimentos, a ideia me pareceu muito clara.
O filme se constitui de uma narrativa protagonizada por Leonardo Di Caprio e sua equipe, sem se preocupar em introduzir sobre cada personagem, mas já começando diante do inédito, a possibilidade de invadir os sonhos e roubar ideias.
Pra quem estuda um pouco sobre criação, é fácil entender que as ideias de cada indíviduo partem de um repertório pessoal, formado pelas experiências únicas de viver. Sejam experiências vivenciadas (quando se vivencia), presenciadas (quando se presencia a do outro) ou apenas ouvidas (quando o outro a "conta").
Nenhuma ideia vem de um "boom" criativo, inexplicável, sem origem. É um exercício mental de extrair do repertório, a melhor construção: a ideia.
Para os designers, por exemplo, muitas logomarcas são desenvolvidas após uma trajetória de experimentos e tentativas, e acabam sendo frutos de uma descontrução contínua e exercitada. Como começar com um quadrado e terminar com um círculo. O que importa não é o começo ou o fim, mas o processo. O processo é o verdadeiro caminho para a desconstrução e criação.
Isso vale para o design ou para qualquer processo de criação.
Quanto maior o repertório, mais diversificada pode ser a ideia, por isso ver filmes, ler, viajar, conhecer pessoas diferentes, conversar, trocar ideias, escrever, refletir, enfim, estimular a imaginação é extremamente importante e necessário para exercitar a mente e a capacidade de criar.
Voltando agora ao filme, fica simples.
Toda ideia possui uma origem particular no indivíduo. Obviamente deve ser difícil identificar exatamente o que do repertório pessoal influenciou nessa ideia, por isso, entra o subconsciente (ou o inconsciente para Jung): a natureza do desconhecido para o ser humano. Tudo aquilo que foge da lógica ou do padrão, como a pedofilia, a vontade de matar, o próprio instinto humano, a paixão, a atração, inveja, sensações, sentimentos e comportamentos impossíveis de controlar, parecem vir desse universo do desconhecido.
Leonardo Di Caprio é o mais habilidoso invasor de mentes, de toda a equipe. Sua habilidade vem da experiência contínua de trabalho e principalmente, das viagens profundas que embarcou com a esposa. Seu trabalho é roubar ideias, ou no objetivo principal do filme, fazer o difícil, a inserção de uma ideia.
Sendo o cinema a melhor ferramenta para ilustrar o mundo dos sonhos e da imaginação, poderia haver representação melhor que um cofre, um forte, um cadeado para guardar aquilo que temos de mais precioso na mente como nossas ideias mais criativas e conflitos/desejos pessoais internos?
Se é possível invadir, é possível proteger, portanto as cenas de ação do filme se baseiam nos mecanismos de defesa que a mente da vítima criou para proteger o que tem de mais precioso, representados por seguranças de terno e óculos.
Para invadir a mente de alguém, é necessário compartilhar do mesmo sonho, momento humano onde a mente relaxa e vaga dentro de si mesma. Somente ali, é possível agir.
E quanto mais profundo é o sonho, mais dentro de si a mente vaga. Por isso, no filme um sonho dentro de um sonho, é interiorizar ainda mais a mente e tentar chegar o mais longe possível do subconsciente, ou o mais perto da origem de uma ideia, um sentimento, um instinto.
Para ir tão fundo é necessário dormir profundamente e não correr o risco de acordar, pois quando se vai muito longe, o risco de confundir a realidade com os cenários criados pela mente, podem ser grandes e irreversíveis. Como uma pessoa que fica em coma, mas não lembra do que aconteceu enquanto esteve em coma. Ou das experiências de morte ou até de situações-limite, onde a mente bloqueia o trauma, fazendo a pessoa pular uma experiência vivida para se proteger de si mesma.
E essa mesma mente é veloz, pois palavras não parecem suficientemente rápidas para ilustrar tudo que pensamos, tanto é que quando falamos rápido demais, tentando acompanhar o pensamento, atropelamos as palavras.
Assim como Nolan, no filme "O apanhador de sonhos" de Lawrence Kasdan 2003, a mente é representada por um lugar, no caso, um pequeno escritório, com diversas gavetas separadas por assuntos. Neste filme, para bloquear algo da mente antes que seja invadida, porum extraterrestre, o personagem procura nas gavetas o que precisa deletar, num exercício desgastante de procura e bloqueio.
E sempre que esqueço uma palavra, um nome, uma informação, imagino uma figura miniscúla de mim mesma, como uma estagiária nervosa e estressada, procurando incansavelmente nas gavetas, a informação que gostaria de lembrar. Às vezes levam minutos, às vezes horas, às vezes dias, e de solavanco, escovando o dente ou no meio de uma conversa tola, lembro de um nome que não lembrava dias atrás. "Eureca". A estagiária encontrou! =)

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