quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

"Os homens que não amavam as mulheres" de David Fincher 2011

 

O que nos faz querer ver um filme?! A história? O elenco? O trailer enigmático? As críticas negativas ou positivas?! 

Talvez não haja uma explicação lógica, apenas uma atração inesperada em conhecer algo diferente. E este filme em especial me provocou muita curiosidade, mesmo sabendo ser a segunda versão fílmica (e hollywoodiana) adaptada do romance 'Män som hatar kvinnor' de Stieg Larssonde, sucesso entre o público adulto. (A primeira versão fílmica sueca foi realizada em 2009 e ainda não assisti!)

É preciso estômago forte para sentar na poltrona e ver este filme até o fim quando se é mulher (e um homem sensato e 'decente'), assim como precisei quando assisti "Irreversível" de Gaspar Noé (2002). 

O filme não se trata apenas de um suspense policial, protagonizado pelo jornalista polêmico, Mikael Blomkvist (Daniel Craig), envolvido em um escândalo político, contratado por Henrik Vangerum (Christopher Plummer), um homem rico e com uma família enigmática, para descobrir o que aconteceu com sua sobrinha Harriet, desaparecida há 40 anos. 


O centro da história é a violência contra as mulheres, de todas as naturezas possíveis, em especial a violência sexual, materializada pela competente atuação de Rooney Mara na personagem inesquecível de Lisbeth Salander.

Lisbeth é uma hacker punk e antisocial, que esconde de todas as maneiras possíveis qualquer traço de feminilidade, sexualidade e sensibilidade. Não é preciso muito tempo para entendermos que sua vida foi marcada por profundos traumas e sua aversão aos homens é visível. Diante de uma situação limite vivida, Lisbeth revelou sua psicose, diria Jung. Em horas de lazer, usuária de drogas, álcool e sexo consentido. Ela não vive, sobrevive!

Sob tutela do estado, depende de tutores para ter acesso a dinheiro e manter sua 'liberdade', mas sua ficha é longa e suja demais para ter qualquer credibilidade diante de qualquer tipo de extorsão e violência física por parte de seus 'tutores'. É nessa fragilidade física e social que Lisbeth é mais uma das tantas mulheres exploradas e violadas de todas as maneiras possíveis, por homens que se julgam superiores e 'invencíveis'. 

Sofremos com sua dor e desejamos a doce vingança (aquela mesma de "Dogville" de Lars Von Trier - 2003) que coroa a reviravolta na trama com a tatuagem "Eu sou um porco estuprador", pois em seguida Lisbeth conhece Mikael e é contratada para desvendar o desaparecimento de Harriet.

Dois protagonistas que evoluem em tramas paralelas e que se unem para desvendar uma série de assassinatos cruéis associados a passagens bíblicas, onde as vítimas são mulheres, estupradas, esquartejadas e desfiguradas. Mulheres-objeto, usadas, abusadas e descartadas como lixo. Vingança doce e dupla!!

Lisbeth em sua obsessão hacker ajuda Mikael a cruzar as informações e encontrar o assassino de todas elas, o irmão falecido de Henrik (o tio de Harriet). Porém, toda essa crueldade foi praticada na presença do primogênito Martin (Stellan Skarsgård), também serial killer de mulheres e irmão de Harriet. Sua sexualidade e desenvolvimento psicossexual incorporaram a crueldade paterna, dando continuidade aos abusos sexuais familiares já existentes.

A revolta com 'os homens que não amavam as mulheres' é tão grande que sentir aversão à humanidade se torna natural, mas Lisbeth nos surpreende ao mostrar doçura e delicadeza ao se envolver sexualmente e emocionalmente com Mikael, figura protetora e gentil. "Eu fiz um amigo!" diz ela ao final. 

Muitos homens ainda não amam as mulheres, mas Fincher nos apresenta uma anti-heroína, em toda sua agressividade e rebeldia, necessárias num mundo tão hostil e cruelmente humano. Precisamos acreditar que outras 'Lisbeth' existem, guerreiras e sobreviventes. E desejar secretamente justiça 'olho por olho', 'dente por dente', pois não há punição que remedie a dor de (sobre)viver algumas violências. Eu prefiro a morte!

A trama é forte, cruel, acompanhada de uma trilha sonora tensa e sombria, repleta de personagens enigmáticos, sarcásticos e dúbios. E o cenário é mais verossímel que qualquer conto de fadas. O filme 'makes me sick' (me deixa enjoada) e culpada de assistí-lo. Mas às vezes, entre alguns 'happy ends' e 'mundos cor de rosa' é preciso encarar a complexidade humana e as manifestações sexuais injustas, reais e atuais em nossas sociedades. 'Humano demasiado humano'. 'Além do bem e do mal!' diria Nietzsche.


É preciso falar sobre o paternalismo e machismo perpetuados há séculos entre os homens, manifestados explicitamente através das violências físicas e sexuais tão presentes nas mídias, ainda que muitas organizações sociais pré-históricas fossem comprovadamente matriarcais e coletivas. Tudo pelo poder...uma pena!

É preciso mostrar o extremo e o horror para provocar desconforto, choque e talvez alguma reflexão em mulheres que se tratam como objetos, e se permitem ser usadas, inferiorizadas, submissas, caladas e infelizes. Há mulheres que não se amam!

Aos homens que simplesmente 'não amam' as mulheres, Lisbeth! =)

2 comentários:

Leandro Coêlho disse...

Boa crítica. Pelo visto viu este filme, mas tem que assistir ao outro "original", a versão sueca.
Vi este sueco de 2009 e não estava animado para ver esta versão, já que não fiquei tão fã do filme. Mas já que está concorrendo ao oscar e gosto de ver todos (ou pelo menos tento), devo vê-lo hoje.
Vamos ser o que acharei desta versão, mas sei que o final foi mudado, como disseram em entrevistas à imprensa.

ally_c disse...

Olá Leandro! Ainda não vi a versão sueca, mas verei e já comprei os livros pra conhecer melhor a obra original! hehehehe Gostei da temática, ainda que 'chocante'! =)
Depois podemos debater mais sobre! hehehe =)