por Alessandra Collaço da Silva
“Catar” é a busca pelo que sobrou das colheitas, mas também é a busca por outras sobras. Sobras das feiras, do lixo, dos restos das pessoas. Daquilo que ninguém mais quer, mas que pode ser aproveitado por aqueles que não tem a escolha de querer ou por aqueles que enxergam possibilidades além das que lhe são impostas.
“Catar” é a busca pelo que sobrou das colheitas, mas também é a busca por outras sobras. Sobras das feiras, do lixo, dos restos das pessoas. Daquilo que ninguém mais quer, mas que pode ser aproveitado por aqueles que não tem a escolha de querer ou por aqueles que enxergam possibilidades além das que lhe são impostas.
Nem sempre o resto é totalmente descartável. Ele pode ser reaproveitado, reciclado, reutilizado, revisto. Pode se tornar outra coisa, pode ser inovador. E é o catador(a) quem pode criar um novo destino para aquilo que foi descartado.
Conceitos, visões, pensamentos, reflexões, representações, manifestações artísticas. Agnes, além de realizadora, é também uma catadora conceitual.
Talvez como ponto de partida ou como reflexão, o documentário de Agnes ruma a algo além do tema sugerido ou da história e/ou intenção em si. A interação da realizadora com o tema, a narração das suas escolhas e das suas observações, sobrepõem-se sobre o conteúdo. Agnes nos narra o que vê, o que sente, e o que pretende. É uma relação além do que intenciona documentar. É a sua descoberta da câmera e a tentativa de torná-la seu olhar, ou apenas um olhar. Mesmo desconhecendo as limitações do equipamento, tenta registrar algo além do que vê: aquilo que sente em relação ao objeto.
Agnes às vezes nos parece ingênua, mas sua pele enrugada, sua noção de tempo passado, sua aceitação interagem com suas descobertas, e o desconhecimento diante de algo novo torna-se deslumbramento.
A câmera até funcionaria como o olho humano, mas não possui um cérebro que possa codificar e decodificar mensagens, significações, pensamentos, intenções. Ela apenas mostra o que os olhos vêem, mas a identificação ocorre de outra maneira, e Agnes tenta transmitir algo além de sua própria compreensão. Tenta de alguma forma nos envolver, nos explicar, mas nós, espectadores, estamos limitados às imagens, e apenas traçamos uma relação da realizadora com aquilo que ela tenta nos contar. Descobrimos uma relação da realizadora com o objeto narrado. É nessa relação que o filme acontece. O filme não é apenas de catadores e catadoras com suas experiências e reflexões, mas é um filme sobre Agnes e sua relação com as coisas e pessoas. É um documentário sobre alguém que tenta documentar algo. É um documentário sobre uma catadora de imagens, de conceitos, de descobertas, porque catar também é descobrir uma nova utilidade para aquilo que parecia inútil.
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